
Amanhã vou para a vindima. Cortar cachos e não uvas porque as uvas não se cortam.
Uma festa ancestral que remonta a umas centenas de anos atrás, julgo que introduzida pelos romanos.
Imagino a frustração dos primeiros agricultores que depois de espremer o néctar docíssimo o viram transformado em vinho pouco tempo depois. Não me acredito que gostassem do que provaram, não se gosta de vinho á primeira, é preciso aprender a gostar. Portanto acho que foi um acto falhado durante muito tempo, queriam sumo e obtinham essa coisa ruim.
Certo dia havia uma grande seca, e como não tinham mais nada para beber beberam a coisa ruim. E então veio a bebedeira, eles acharam piada ao que viam e sentiam, e fizeram mais, e beberam, mais e mais…
E então começou o alcoolismo, a violência doméstica, as doenças mentais e do fígado, a degradação da sociedade.
E a coisa ruim deixou de ser a coisa ruim e passou a chamar-se vinho. E passou a ser bom, e tornou-se das principais mercadorias comercializadas. E havia pessoas que sabiam de facto apreciar vinho, e outros que só sabiam apreciar a garrafa vazia com os olhos esbugalhados.
E o vinho chegou aos nossos dias.
E eu também gosto de vinho. Quando degusto um bom prato de carne, se penso num bom vinho tinto, cresce-me logo água na boca e então para não estar só a água tenho mesmo de beber vinho.